
Quando eu nasci, meus dois avôs já haviam partido. Cresci ouvindo histórias de que eram divertidíssimos e com um senso de humor fantástico. Ainda hoje ouço alguém dizer "você teria adorado eles se estivessem vivos".
Então eu tive um avô postiço, daqueles que eu brincava e ganhava presentes como se fosse neta de verdade. E no fundo, no fundo, eu era. Ele, o vovô Heli, marido de uma tia avó, acaba de virar uma estrelinha no céu. Foi embora ontem e deixou saudades. Acordei hoje com a notícia e fiquei um pouco atordoada. Não o via há alguns anos e sempre tinha notícias por um ou outro parente. A ficha tá começando a cair só agora. E tá sendo doloroso.
Era também meu padrinho de batismo. Quando mamãe ainda nem sabia que estava grávida, ele pegou na barriga dela e disse: "A Mayra está aqui". Então ela fez o teste, que deu positivo, e depois nasceu esta menina que vos fala. Acertou duas vezes: na gestação e no sexo da criança.
Seu único filho, o poeta Torquato Neto, se matou aos 28 anos. Nem ele nem minha tia avó foram os mesmos depois da tragédia, mas ele tentava manter a alegria de viver. Viveu do jeito que quis. Era um personagem, uma caricatura. Amava intensamente e sempre soube demonstrar isso. Soube aproveitar muito bem seus 92 anos de vida. Foi bom enquanto durou.
A estrelinha subiu. Hoje a noite vou olhar pro céu e sei que ele vai estar lá sorrindo pra mim, como fazia quando ia me pegar na casa da minha avó pra passar o final de semana nas férias. O céu hoje vai ficar mais feliz, com certeza. E aqui embaixo a gente se conforta com o calor e a lembrança daquele sorriso.
Beijinhos com saudade.