quarta-feira, julho 04, 2012

The Book is on the Table, EVER!



(Texto publicado em 30 de abril de 2005)


Eu não sei falar inglês. Eu finjo que sei. Aliás, finjo muito bem, se querem saber. Pra não pensarem que sou uma completa ignorante no assunto, posso dizer que me saio muito bem quando tomo umas e outras ou quando estou sob pressão. Aí viro poliglota. Faço até tradução simultânea. Ahã. 


A coisa funciona assim: no meu estado normal (sim, ele existe) eu entendo até bem quando ouço alguém falando e leio em inglês direitinho. O problema é que eu moooorro de vergonha de falar. O pouco que eu aprendi me garante a comunicação (gente, eu me comunico sempre e de qualquer jeito, é bom que isso fique claro!), mas eu não sei construir frases muito bem. Para acabar com essa vergonha, só (muito) álcool. Ou a necessidade pura e simples. Oh yes!


Momento será-que-dá-pra-chamar-ela-ou-tá-difícil?? 


Há alguns anos, minha adorável prima foi fazer um curso no Japão. Nessa época, eu morava sozinha e adorava dar telefonemas de madrugada pra todo mundo, uma vez que eu chegava tarde em casa das baladas e a tarifa era mais barata. Imaginem então pro Japão, já que rolava sempre a diferença de fuso e aquela sensação de não acordar ninguém, pois era dia lá!!! Até que Ana Paula Arósio me aparece com aquele rostinho de boneca na tv e me conta que ligar pro Japão tá com um precinho ótimo com o 21. Ôpa!!! Vamos nessa!! Cheguei em casa por volta das 4h da manhã já animadíssima de tanta cerveja e decidi matar saudades da priminha. Liguei pra escola dela e uma voz ajaponezada atendeu falando-qualquer-coisa-que-eu-não-entendi (ah, gente, entender inglês já é difícil, falado por um japonês então... tão querendo muito!!), supus ser algo tipo "Escola Japonesa Que Ensina Brasileiros, boa tarde". Fiz voz de aeroporto e falei (vagarosamente): 


- Please, I want to talk with Clarissa Carvalho. Room eight-eight-seven. (ufa! Acho que consegui!). 

- Origami sukiyaki ikebana karate. 
- Helloo-ôu! I said room eight-eight-seven, please! 

- Cri-cri-cri...
- Helloo-ôu! I said room eight-eight-seven, please! - Sushi sashimi tai chi chuan sayonara. 

Eu tava quase ficando louca e me convencendo que um sobrinho do Buda tinha atendido ao telefone, até que um ser falou comigo em inglês e me disse que minha prima tava viajando pra Tóquio, a passeio (chato, né?). Pra não perder a ligação, passei boa parte da noite conversando como o fulano, um tal de André. Não entendi bem de onde ele era nem que curso tava fazendo. Mas dei boas gargalhadas (garanto que ele também) depois de meia hora de papo. Tive a certeza de que tinha me saído bem quando falei com minha prima num outro telefonema e ela me disse tudo o que nós tínhamos conversado (ele contou pra ela). Ponto pra mim! A coisa foi tão bacana que eu até pedia pra chamá-lo quando ligava e ela não podia atender. Virou meu melhor amigo (ahã).  O que a cachaça não faz... 


Momento pra-holandês-ver: 


1997, carnaval em Olinda. Eu e Mrs. Aviani chegamos com nossas mochilonas e fomos procurar a casa onde iríamos nos hospedar. Como não tínhamos compromisso com nada, o calor tava grande e as ladeiras não acabavam nunca, decidimos sentar num boteco e tomar uma gelada para descansar um pouco e continuar a jornada (tão pensando que é fácil desfilar por aquelas ruas com um peso enorme nas costas??). Relaxamos tanto que encontrar a casa virou um mero detalhe. Eis que passa na nossa frente um cara leeeeiiiindo, sem camisa, com umas tatuagens bacanérrimas e um bronzeado-de-gringo sem igual, com cara de perdido. Como nós. Ficamos só babando. Eita que esse carnaval promete... 


Quando encontramos a casa que tínhamos alugado junto com a torcida do Flamengo, a do Corinthians e a do Sport Club do Recife (affe, nunca vi tanta gente num lugar só!), demos de cara com quem, com quem???? Uma nota, Maestro Zezinho!!! O cidadão-tatuado-no-braço-calção-corpo-aberto-no-espaço-coraçãããão!!! Isso mesmo, o gringo gato com cara de perdido que tínhamos visto lá no bar. O mocinho também estava hospedado na nossa casa. (Batendo palmas, clap clap. Dando um grito uuuuuu. Levanta a mão passando energia!!!). Só nos restou fazer amizade, é claro (depois das cervejas, tudo é possível). 


Descobri que o bofe era holandês, morto de lindo e gente boa (muito boa), estava no Brasil há dois meses, rodando todo o litoral. Conversei horroooooooooooooores com ele. Não sei de onde saiu tanto vocabulário. O inglês saiu com uma naturalidade incrível (o que não é a necessidade misturada com o álcool, hein?). Eu estava me sentindo a própria colaboradora da revista Speak Up naquele momento. A sintonia foi tanta que arrumei um namoradinho holandês de quebra pra passar o carnaval inteiro (boba, eu???) e ainda treinar a "língua". Hohohoho.. Afinal, eu estava ali de passagem... 


Momento help-I-need-somebody! 



2002, Festival Internacional de Cinema de Brasília, na Academia de Tênis. Eu trabalhava na produção e minha amiga Marina trabalhava como hostess dos diretores, atores, produtores do mundo todo que participaram do evento. Um deles era ninguém menos que Morgan Freeman. Marina era a responsável por andar com ele pra cima e pra baixo, traduzindo tudo que ele dizia. Tinha vindo pra lançar o filme (péssimo, por sinal) Crimes em Primeiro Grau, que seria exibido no antigo Americel Hall, a maior sala de espetáculos de Brasília. 

Sala lotada de gente ansiosa e todo mundo do staff nervoso. Marina deixou Morgan (para os íntimos, tá?) comigo enquanto organizava tudo no restaurante para onde ele iria na seqüência, depois de apresentar o filme pro público. Até aí, tudo bem. Eu só precisava dizer algo tipo "Come here, Morgan. Follow me". Ele só tinha que me seguir até o camarim. Fácil essa parte. Tiraria de letra.


Faltando 40 minutos para ele entrar em cena e o filme ser projetado, cai uma fase de luz e o teatro fica quase às escuras. Pânico na torre. Ou seria no camarim??? Eu lá com Morgan, tentando manter a calma e fingindo naturalidade. Pelo rádio, chamei o pessoal da produção e em bom português perguntei o que estava acontecendo (e ele me olhando do alto de seus quase 2 metros de altura). Pediram pra eu manter a calma pois a CEB já estava a caminho para resolver o problema. Oh my Gawd!! 


Agora imaginem aí uma mulher-que-não-fala-inglês, sozinha num camarim com Morgan Freeman. Pois é. Ele, a simpatia em pessoa, olha pra mim e pergunta se estou bem. Digo "yes". Ele pergunta se estou nervosa. "Yes", novamente. E se pode me ajudar. Gaguejei "No, yes, no, yes...". Foi aí que me denunciei. Olhei pra ele e disse que meu inglês não era muito bom, mas que eu faria o possível para ele me entender direitinho. Ele respondeu com voz de ator-do-Seven "tenho certeza que seu inglês é muito melhor que meu português" (ai que fofo!). Falei macarrônicamente o que estava ocorrendo e que só nos restava aguardar. Ufa!! Consegui de novo!! 


Até que entram no camarim a mulher dele, a filha, a empresária e o Peter (até hoje não entendi se era amigo ou segurança ou os dois juntos). Juro pra vocês que nessa hora eu quis sair correndo e me atirar de cima do palco dando um moche pra platéia. Como assim eu vou ter que me comunicar com esse tanto de gente ao mesmo tempo??? Cadê a Marina???? Eu quero a minha mãe!!! Putz. 


Resumo da ópera: Morgan falou pra eles o que estava acontecendo, ficaram todos esperando animadamente, contando piadas (que eu entendia!!! Rá!) e rindo à beça. Foi lindo!!! E eu lá, jurando amizade. Falando inglês "fluentemente" e contando mil histórias (e sem álcool, afinal, eu estava trabalhando!!!). Até que a luz voltou, tudo deu certo e a cortina fechou. Aplausos, por favor! 


Depois disso tudo, me convenci que não tem escola de línguas melhor do que você se deparar frente a frente com a situação e abraçar a causa (ou o holandês, aí você escolhe). Me diverti muito, sempre. Vai ver as sopas de letrinhas que mamãe me deu quando era criança eram importadas... risos. Pra não dizerem por aí que sou mentirosa, taí a foto do dia fatídico: 


Beijinhos em várias línguas, canções e gestos. Afinal, a comunicação é uma coisa universal.